BINGO
As ferramentas de análise de dados
A banda de operação do radiotelescópio BINGO será delimitada entre 960 MHz e 1260 MHz. Processos físicos de origem atmosférica, galáctica e extragaláctica emitem nesta faixa de frequências, com intensidades que somadas chegam a 10.000 vezes a intensidade do sinal de emissão em 21 cm do HI, que é o que se deseja detectar [1]. Esses processos são conhecidos como foregrounds. A figura 7.1 apresenta a temperatura de antena, que é uma medida da intensidade do sinal captado pela mesma, para as emissões dos diferentes foregrounds passíveis de serem detectados pelo instrumento, medida em mK.
Figura 7.1: Temperaturas de Antena em mK produzidas pelas componentes de emissão atmosférica, galáctica e extragaláctica, bem como da CMB, em uma janela entre 300 MHz e 300 GHz. Fonte: https://asd.gsfc.nasa.gov/archive/arcade/science_galaxy.html
Na figura 7.1 é possível notar que, em torno de 1 GHz, os sinais mais intensos são a CMB e as emissões síncrotron e bremsstrahlung, tanto provenientes da nossa Galáxia quanto de outras galáxias. Só a emissão atmosférica produz uma temperatura de antena de cerca de 1 mK, cerca de 10 vezes a temperatura de antena da emissão em 21 cm do HI. Além das emissões dos processos físicos mencionados anteriormente, o sinal total captado pelo BINGO terá também uma componente referente à temperatura de ruído do sistema Medidas feitas em bancada possibilitaram estimar essa temperatura em torno de 50 K (2).
Por fim, é possível perceber que, devido à intensidade muito baixa do sinal de interesse, o ponto chave da análise de dados é recuperar o sinal de HI a partir do sinal global medido pelo BINGO. O procedimento de reconstrução do sinal de interesse é chamado de separação de componentes, ou também, de remoção de foregrounds. Este processo consiste em isolar a componente de interesse de todas as demais presentes nos dados [2]. Dito de outra maneira, significa reconstruir o sinal de interesse com suas características mais parecidas possíveis com as da sua forma original.
Com intuito de testar e otimizar os parâmetros construtivos, operacionais e o próprio processo de análise de dados, foi desenvolvido pela colaboração um conjunto de rotinas computacionais e procedimentos que simulam a operação do BINGO, conhecida como pipeline. Seus dados de entrada são os mapas dos diferentes mecanismos de emissão apresentados anteriormente, produzidos por modelos teóricos ou por observações, bem como os ruídos inerentes ao equipamento e ao ambiente. A estes são acrescentadas características construtivas do radiotelescópio, como número e arranjo de cornetas, projeto óptico e características dos receptores.
A pipeline produz como saída mapas de temperatura e séries temporais que simulam o sinal captado pelo instrumento durante um dado período de operação. A figura 7.2 apresenta de forma genérica as etapas de uma pipeline de análise de dados, abrangendo desde a produção dos dados "brutos" pelo instrumento até a análise de dados, incluindo a recuperação do sinal cosmológico (nesse caso, da CMB) e a estimativa de parâmetros cosmológicos.
Figura 7.2: Fluxograma de análise de dados de dados de um experimento de CMB (Fonte: https://space.mit.edu/home/tegmark/cmb/pipeline.html)
Os dados "brutos" de saída, que seriam os dados produzidos pelo BINGO, passam ainda por um processo de separação de componentes, de forma a recuperar o sinal de HI. Existem diversos métodos de separação de componentes. Os mesmos são classificados em dois grupos: paramétricos e não-paramétricos. Os métodos paramétricos são aqueles que necessitam de um conhecimento prévio sobre as componentes que se deseja remover. Já os não-paramétricos não necessitam de informações sobre os foregrounds, porém podem fazer uso de uma estimativa do sinal de interesse, como por exemplo uma distribuição espacial aproximada do HI, produzida a partir da distribuição de galáxias.
Um dos métodos de separação de componentes que está sendo testado pela colaboração é o Generalized Needlet Internal Linear combination (GNILC) [3]. Este é um método não paramétrico que faz uso de uma estimativa do espectro de potência do HI, obtida a partir de outros experimentos, como "pista" para reconstruir o sinal do mesmo.
A figura 7.3 apresenta um fluxograma simplificado com as etapas da pipeline que está sendo utilizada pelo BINGO. A figura 7.4 mostra um dos mapas de entrada usado na simulação do céu visto pelo BINGO e a figura 7.5 contém o mapa de HI, também usado na simulação do céu visto pelo BINGO. Ambos os mapas estão em unidades de temperatura de antena (K), na frequência de 1110 MHz. Esses são dois dos componentes de entrada da pipeline mostrada na figura 7.3. A figura 7.6 contém o mapa de HI recuperado, já com a máscara removendo o plano Galáctico, e com os efeitos da estratégia de observação do BINGO, visíveis na faixa cinza. A escala de cores foi alterada para contrastar com a região cinza e as unidades estão em mili Kelvin (mK). O mapa recuperado foi obtido usando a ferramenta de separação de componentes GNILC.
Figura 7.3: Fluxograma da pipeline de simulação do BINGO
Figura 7.4: Mapa teórico de Emissão Síncrotron, na projeção de Mollweide, em coordenadas celestiais, na frequência de 1110 MHz e limitado a 10 K
Figura 7.5: Mapa teórico das flutuações da emissão em 21 cm do HI, na projeção de Mollweide, em coordenadas celestiais, na frequência de 1110 MHzO
Figura 7.6: Recuperação do sinal da figura 7.5, a partir do céu observado com a configuração atual do BINGO. Note a presença da máscara de remoção do plano Galáctico, nas duas regiões em cinza. (Frequência: 1110 MHz)
Referências:
- Wuensche, C. A., and BINGO Collaboration. "The BINGO telescope: a new instrument exploring the new 21 cm cosmology window." Journal of Physics: Conference Series. Vol. 1269. No. 1. IOP Publishing, 2019.
- Delabrouille, Jacques, and J-F. Cardoso. "Diffuse source separation in CMB observations." Data Analysis in Cosmology. Springer, Berlin, Heidelberg, 2008. 159-205.
- Remazeilles, Mathieu, Jacques Delabrouille, and Jean-François Cardoso. "Foreground component separation with generalized Internal Linear Combination." Monthly Notices of the Royal Astronomical Society 418.1 (2011): 467-476.