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Cosmologia

Publicado Por: INPE
Última Modificação: Fev 19, 2020 15h51

Correlação cruzada

Diante das dificuldades decorrentes do processo de contaminação pela Galáxia, torna-se mais do que necessário investir numa solução cujo resultado seja pelo menos satisfatório para avaliar as implicações cosmológicas de uma medida da RCF. Sendo assim, nada nos impede de procurar esta solução com a mesma formulação matemática que caracteriza as flutuações na temperatura da RCF. Desta forma passaremos a nos preocupar com a distribuição angular dos sinais contaminantes.

Kogut et al. (1996a) assumem este tipo de postura diante do problema e propõem que os mapas do DMR sejam representados como uma superposição das variações de intensidade na RCF e de um mapa externo (modelo) da emissão da Galáxia, tal que

ΔΤDMR = ΔΤRCF + ηΔΧGAL , (41)

em que η é um fator de conversão da escala de unidades do mapa Galáctico para a temperatura de antena na freqüência do DMR. Mas, ao invés de procurar a solução ponto-a-ponto, minimizam a função de mérito,

χ2 = ∑n,m (C - ηΑ)n(M-1)nm(C - ηΑ)m , (43)

entre a função de correlação cruzada,

C(θ) = ∑i,j ΔΧiGALΔΤjRCF , (45)

e a função de autocorrelação,

Α(θ) = ∑i,j ΔΧiGALΔΧjGAL , (47)

sobre todos os 72 bins angulares n e m que separam cada par de pixels {i, j} para encontrar η. M é a matriz de covariância de C(θ), que é obtida por simulações de Monte Carlo para as variações de intensidade na RCF segundo um espectro de flutuações invariante de escala do tipo Harrison-Zeldovich e normalizado no valor correspondente de quadrupolo obtido pelo DMR.8 Como os mapas das variações são mapas isentos das características peculiares dos respectivos quadrupolos, dipolos ou monopolos, a constatação de uma significância estatística na correlação cruzada com o ajuste de η poderá ser interpretado como uma prova de que existe contami-nação na estrutura espacial dos mapas devido à presença do componente Galáctico representado no mapa ΔΧGAL.

Os mapas escolhidos para representar os mapas externos da Galáxia foram: (a) o mapa de Haslam em 408MHz, (b) o modelo do componente síncrotron descrito na seção 3.2.1, e (c) os mapas em 100, 140 e 240 μm do DIRBE. Em cada caso foram feitos cortes em latitude a 20° ou 30°.

Os resultados mostraram que não havia correlação estatisticamente significativa entre os mapas do componente síncrotron e os do DMR, mas que a morfologia dos mapas do DIRBE produzia um resultado positivo. No mapa mais sensível do DMR (53GHz) o rms das flutuações devidas à poeira corresponde a ΔΤGAL = 7,1 ± 3,4 μK para |b| > 30° e resolução angular de 7°, sendo que a incerteza reflete o efeito do ruído instrumental e da própria RCF no ajuste de η. Por outro lado, como este valor de rms resulta em aproximadamente o dobro em 31,5GHz, é necessário incluir um outro componente Galáctico, cujo padrão espacial de emissão esteja correlacionado com o da poeira nesta escala angular.

Uma vez que a correlação cruzada entre os mapas do DIRBE e do componente síncrotron em 53GHz produzem valores de η duas ordens de magnitude inferiores do que no ajuste de η entre o DIRBE e o DMR, conclui-se que o componente adicional deve corresponder à emissão livre-livre. A decomposição do sinal mediante o conhecimento de β₁₁ resulta em contribuições equivalentes entre as emissões livre-livre e da poeira em 90GHz, mas a primeira se torna dominante em 53GHz. Este contraste aumenta consideravelmente quando se comparam os ajustes nos dois cortes Galácticos; o que é compatível com a expectativa de uma contribuição ainda maior do componente livre-livre quando são considerados os complexos de regiões HII.

A Figura 1.12 revela a extensão da contaminação Galáctica em termos do desvio médio quadrático da temperatura de antena de seus componentes no trabalho de Kogut et al. (1996a). O componente síncrotron corresponde ao modelo da seção 3.2.1 normalizado pelo ajuste de η em 31,5GHz e implica num limite superior para este componente de ΔΤ < 12μK; ou seja, β[0,408;31,5] > 2,9 (da Equação 16 se obtém β = 2,905 para Βeff = 1,4μG)9. A figura também mostra as contribuições resultantes do ajuste de η entre DIRBE/DMR segundo uma decomposição de poeira (com Τcc = 21 K - 16 K e αcc = 1,4 - 2) e emissão livre-livre quando αcc = 2. A utilização do método da combinação linear descrito no início da seção 3.3 (mas desta vez favorecendo o componente com índice espectral β11 em detrimento do de natureza planckiana) não corrobora, entretanto, a hipótese de que fontes de radiação livre-livre não-correlacionadas com a emissão da poeira poderiam dominar a contaminação livre-livre nas escalas angulares sondadas pelos mapas do DMR. No mínimo, a morfologia da contaminação livre-livre se mostra espacialmente correlacionda com a da poeira.

Finalmente, Kogut et al. (1996a) normalizam o espectro de potência do mapa em 240 μm do DIRBE com o ajuste do valor de η para a decomposição livre-livre/poeira. O procedimento determina o espectro de potência do componente livre-livre em 53GHz que, quando comparado com o do mapa livre-livre resultante da combinação linear, mostra claramente que a ausência de estrutura neste mapa está relacionada à impossibilidade de se distinguir a amplitude do sinal livre-livre na presença de ruído instrumental. Porém, se sua morfologia é especificada a priori por meio da sua correlação com a poeira, é possível prever, a partir de seu espectro de potência, o rms de suas flutuações em escalas angulares menores. Os resultados previstos se mostram inteiramente compatíveis com os valores observados até 0,1°. Numa escala angular de 0,5° a contaminação prevista seria de 1,5 ± 0,5 μK em 53GHz enquanto que sua contribuição ao desvio médio quadrático da anisotropia na temperatura do céu seria de 7,1 ± 3,4 μK para o DMR. Como neste caso detectou-se ΔΤcéu = 42,6 ± 8,4 μK, teremos que as flutuações intrínsecas à RCF,

ΔΤRCF ≡ √ΔΤcéu2 - ΔΤ112 = 42,0 ± 8,5 (μK) , (49)

não são significativamente diferentes.

Imagem da fórmula
Figure: Espectro médio da emissão Galáctica para |b| > 30°. As faixas representam a extensão da contaminação ao nível de 1 - σ. Os limites superiores no caso da poeira representam o sinal da poeira após a decomposição com a emissão livre-livre e possuem uma opacidade normalizada com o mapa do DIRBE em 240 μm.
(Fonte: Kogut et al. (1996a), p. 19).

Uma correlação na distribuição angular da poeira e da emissão livre-livre implicaria, portanto, numa contaminação abaixo de um nível significativo para as medidas de anisotropia em escalas angulares menores que 1°. Assim sendo, não haveria necessidade de considerar sua remoção e evitaria a introdução de ruído estatístico gerado na extração do sinal cósmico a partir de medidas multifreqüenciais.

Carlos Alexandre Wuensche - Criado em 2005-06-02